Opinião

Pergunta

Boa tarde,
Como está, Dr. Garcia Pereira?
Desculpe incomodá-lo, mas se me pudesse esclarecer, sobre o assunto de sairmos do €, ficava agradecida. O Dr. Arnaldo Matos falou nesse assunto, no Teatro D. Maria. Ontem Ferreira do Amaral tb falou na SIC-Notícias. Muita gente diz, que se sairmos do €, os nossos compromissos, não se poderão concretizar, como os empréstimos para a nossa habitação. As prestações sofrerão um grande aumento. Eu desejo, que o meu País recupere a independência e que venha outro governo, que nos dê qualidade de vida, pelo menos a que tínhamos e agora com mais atenção à corrupção. No entanto, tenho medo de ficar sem a minha casa, como muitos portugueses. Isso e outras coisas, pois o escudo vai ser desvalorizado, não sou economista, mas acho, que é assim.
Ferreira do Amaral pode falar nisso, não será prejudicado, mas quem tem pouco, a baixa classe média, como é o meu caso? Fui estudante trabalhadora, tirei o meu curso, reformei-me e as coisas já não estão a ser fáceis. Poderá ser pior? Suponho, que tenha, que haver negociações. Se o Dr. Arnaldo Matos o disse, já posso confiar, que ele terá alternativas, para que não fiquemos prejudicados. O Dr. Garcia Pereira pode esclarecer-me?
Desculpe o incómodo, muito grata,
Maria Eugénia Faria

A Redacção do Luta Popular pediu ao camarada Arnaldo Matos para responder à nossa consulente.


Resposta

A Senhora D. Maria Eugénia Faria é devedora a um banco português de um empréstimo para aquisição de casa própria, empréstimo que lhe cumpre pagar mensalmente, numa prestação que compreende uma parte de amortização do capital emprestado e uma parte do juro convencionado.

Na nossa proposta, a saída de Portugal do Euro é concomitante com a entrada em circulação de uma nova moeda – o Escudo –, com a equivalência cambial de 1 euro = 1 escudo. No dia da saída do Euro e da entrada em circulação do Escudo, as quantias em dívida no banco do empréstimo são imediata e automaticamente convertidas em escudos, com prestações mensais a pagar também em escudos.

Se, nesse dia, a dívida da consulente ao banco para compra de casa própria for, por exemplo, de 200 000 euros, com juros de 6% e prestações mensais de, por exemplo, 500 euros, então automaticamente a sua dívida ao banco passará para 200 000 escudos, com juros de 6% e prestações mensais de 500 escudos.

Nada se altera.

No dia seguinte ao da entrada em circulação do novo Escudo, o governo democrático e patriótico determinará uma desvalorização cambial do novo Escudo em 30%. Esta desvalorização cambial do escudo tem efeito meramente externo e destina-se a aumentar a competitividade dos bens transaccionáveis produzidos em Portugal e a vender no exterior. Simultaneamente, a desvalorização do escudo tornará mais caros (em 30%) os bens importados, forçando à diminuição das importações. A nossa balança comercial, que é tremendamente deficitária, equilibrar-se-á e passará, dentro de prazo previsível, a superavitária.

Deixaremos de pedir dinheiro para pagar o saldo negativo da balança comercial, e passaremos a acumular um superávite em divisas estrangeiras.

Se, sob o domínio do Euro, um português comprava um automóvel estrangeiro por 30 000 euros, no dia da substituição do Euro pelo novo Escudo, continuará a comprar o mesmo automóvel por 30 000 escudos.

No dia seguinte ao da entrada em circulação do novo Escudo, operada que seja a desvalorização cambial de 30% dessa nova moeda, o automóvel acima referido será trinta por cento mais caro e passará a custar 39 000 escudos ou, se tivesse algum meio de pagá-lo em euros - o que não acontecerá –, continuaria a precisar de 30 000 euros.

A desvalorização do escudo só funcionará na ordem externa, pois que na ordem interna, os activos, incluindo o valor dos prédios e das respectivas prestações para pagamento do empréstimo, continuarão sempre com os mesmos valores absolutos e relativos do dia da entrada em circulação do novo Escudo.

Se, com a desvalorização, o valor externo da prestação diminuiria, também diminuiria o valor externo da casa própria adquirida. Só que nem a prestação nem o prédio podem ser exportados.

Tudo ficará na mesma, para a consulente e para todos os devedores de empréstimos bancários para aquisição de habitação própria. E também tudo ficará na mesma para os bancos mutuantes.

Haverá todavia um se, para o qual chamamos desde já a atenção da senhora consulente, e desde já avançamos qual deve ser a solução do governo democrático e patriótico para o caso.

Após a desvalorização cambial do novo Escudo em circulação, o Banco de Portugal terá de fixar as novas taxas de juro bancárias, tanto para redefinir as taxas dos depósitos a prazo e das obrigações de tesouro emitidas, como para redefinir as taxas dos empréstimos bancários; e pode acontecer que haja uma ligeira subida da taxa de juro a pagar pelos devedores dos empréstimos para aquisição de casa própria.

É o tal se...

Nesse caso, e para evitar um incumprimento generalizado destes devedores à Banca, o Estado deve substituir-se a esses devedores, suportando o eventual aumento da dívida em juros na nova moeda, através de um empréstimo que o Estado contrairá junto do Banco de Portugal, expresso na nova moeda.

Mas, para os cidadãos que, como a consulente, estão a pagar prestações bancárias para amortização do empréstimo contraído nos bancos para aquisição de casa própria, nada se alterará.

Com amizade, seu

Arnaldo Matos

 

Publicado em: 07.05.2014