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Espírito Santo: Uma Quadrilha de Bandidos à Solta

1. O Império da família Espírito Santo, capitaneado por Ricardo Espírito Santo Silva Salgado, acaba de ruir como um castelo de cartas. Faliu e desabou, se assim se pode dizer, do topo à base e da base ao topo, e por essa ordem ziguezagueante. Constituído por cerca de quatrocentas empresas, entre si ligadas por uma complexa rede de participações financeiras, o Grupo Espírito Santo (GES) – tal era o nome do império – empregava mais de 28.000 trabalhadores em três continentes: Europa (só em Portugal, 20.000), América Latina e África, não contando com umas quantas adjacências na América do Norte, nas Caraíbas e em alguns Estados do Golfo Arábico.

O Grupo Espírito Santo era dominado e controlado a partir de uma sociedade gestora de participações sociais – uma holding, vocábulo anglo-saxónico que já faz parte da linguagem jurídica portuguesa – denominada Espírito Santo Control, ao comando da qual se posicionava um conselho superior, formado pela quadrilha de burlões da família Espírito Santo, assim constituído: Maria do Carmo Moniz Galvão Espírito Santo, com 19,37% da holding, José Manuel Espírito Santo, com 18,53%, Comandante António Ricciardi, com 17,84%, Ricardo Espírito Santo Silva Salgado, com 17,05% e Pedro Mosqueira do Amaral, com 15,57%.

Ora, fazendo as contas (como aconselharia o Eng.º Guterres em tempos idos…) a família Espírito Santo detém, naquela sociedade gestora de participações sociais, 88,36% do Grupo Espírito Santo, isto é do GES. Por seu turno, a sociedade Espírito Santo Control distribui o capital da família Espírito Santo por duas outras holdings, a saber, a Espírito Santo Internacional (ESI) e a Rioforte.

Através da Rioforte, detêm a holding financeira do GES, denominada Espírito Santo Financial Group (ESFG), que, por sua vez, detinha 20,1% do Banco Espírito Santo (BES).

Acontece que as três últimas holdings mencionadas – ESI, Rioforte e ESFG – têm sede no Luxemburgo, o que significa que as sociedades que controlam todo o Grupo Espírito Santo têm sede fora da área de jurisdição de Portugal, ou, dito de outra maneira, todo o Grupo Espírito Santo é controlado por sociedades que têm jurisdição no Grão-Ducado do Luxemburgo. Ou ainda, para tornar mais acessível a simplificação da coisa, o Grupo Espírito Santo não é português!...

A realidade porém é que a quadrilha de bandidos da família Espírito Santo desenvolveu um esquema de financiamento fraudulento entre as empresas do GES. Por um lado, servia-se dos depósitos bancários do BES para, muitas vezes sem conhecimento e sem autorização dos depositantes, levar os dinheiros depositados ao financiamento das empresas do grupo; e, por outro lado, quando se apercebia que a fraude não podia mais continuar a ser escondida, Salgado e os seus homens punham o banco a comprar as carteiras dos clientes com créditos sobre as empresas do GES. Algum tempo depois, alegando que a empresa devedora falhara o pagamento do crédito, deixava o cliente bancário com o calote da empresa devedora e embolsava o dinheiro do depositante.

Este esquema fraudulento, conhecido pelo nome de Pirâmide de Ponzi, é mais velho do que a Sé de Braga, mas os nossos supervisores nunca o detectaram a tempo!... Este, porém, é apenas um dos múltiplos esquemas criminosos com os quais enriqueciam os donos do império Espírito Santo.

Ora, nos fins de Junho e princípios de Julho últimos, à medida que se ia vendo cada vez mais apertada, a quadrilha de gatunos da família Espírito Santo pediu aos tribunais de comércio luxemburgueses que protegessem dos credores as suas holdings Espírito Santo Internacional, Rioforte e Espírito Santo Financial Group, porque estas sociedades, gestoras de participações sociais que controlavam todo o Grupo Espírito Santo, deixaram de poder pagar aos credores.

Iniciou-se assim no Luxemburgo um processo judicial destinado a vender todos os activos daquelas três holdings (ESI, Rioforte, ESFG) – quer dizer, todos os activos de todas as empresas de todo o Grupo Espírito Santo – para, com o produto da venda, pagar, na proporção do dinheiro por ela disponibilizado, aos credores das três holdings.

Note-se que Portugal e a jurisdição portuguesa não podem meter nem prego nem estopa no processo de insolvência que correrá seus termos no Luxemburgo. O próprio Banco Espírito Santo (BES) – o banco do Grupo Espírito Santo, com sede em Lisboa – é um mero activo da holding Espírito Santo Financial Group (ESFG), pelo que o juiz luxemburguês fará desse activo o que melhor entender para satisfazer os credores da insolvente ESFG. Quanto mais dinheiro o Estado português injectar agora no BES, mais dinheiro terá o juiz no Luxemburgo para pagar aos credores da holding ESFG e menos dinheiro lá ficará para o governo português resgatar o investimento que está a fazer de 4,5 mil milhões de euros para salvar o BES, assunto este a que voltaremos adiante.

Sucede, porém, que as holdings de controlo de Grupo Espírito Santo – Espírito Santo Control, Rioforte e Espírito Santo Internacional – já estão falidas desde 2012, sem que o governador do Banco de Portugal (BdP), Carlos Costa, ou o presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), Carlos Tavares, encarregados da supervisão do GES, tenham dado por nada…
Na verdade, em 2012, último ano de que foram publicados números, o quadro de resultados das três sociedades gestoras de participações sociais que controlavam o Grupo Espírito Santo (GES) era este:

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Assim, e naquele ano, as três holdings de controlo do Grupo Espírito Santo tinham, para um activo conjunto de 7,3946 mil milhões de euros, acumulado um prejuízo global de 12,5 mil milhões de euros, ou seja, tinham acumulado um prejuízo que engoliu quase duas vezes o activo conjunto das três sociedades.

Em 2012, o Grupo Espírito Santo já estava falido, ainda que a quadrilha de bandidos, comandada pelo bandido-mor Ricardo Salgado, tenha conseguido iludir a insolvência, com a transformação contabilística de um prejuízo de 12,5 mil milhões de euros numa dívida de apenas 5,525 mil milhões de euros… Manobra de cuja autoria veio, conjuntamente com outras manobras, a acusar mais tarde o contabilista!

Claro está que os supervisores não viram nada; mas também não viram nada nem os deputados dos partidos políticos da oposição, nem os economistas, gestores e financeiros do Instituto Superior de Economia e Gestão, da Universidade Nova e da Universidade Católica, assim como também nada viu aquele caquético e patético pseudo-economista que dá pelo nome de Medina Carreira, e que todas as semanas perora na TVI contra os níveis dos salários dos funcionários e das pensões dos reformados, e contra o custo da escola pública e do serviço nacional de saúde…

Em 2012, o Grupo Espírito Santo já estava irremediavelmente falido, já tinha acabado com a prestação pública das contas, e nenhum dos supervisores deu conta do caso. Por incompetência – ou corrupção? – dos dois supervisores, a quadrilha de bandidos à solta foi sacando dinheiro das muitas empresas do Grupo e foi-o colocando a bom recato nos offshores do mundo.

Hoje, os membros da quadrilha estão podres de ricos, a tal ponto que o quadrilheiro-mor, Ricardo Salgado, não teve qualquer dificuldade em pagar ao juiz de instrução criminal uma caução de três milhões de euros, para obstar à prisão como arguido dos crimes de burla, de lavagem de dinheiro, de abuso de confiança e da falsificação de documentos.

Enquanto o Alibabá do Grupo anda à solta e nada em dinheiro, o erário público já esportulou 4,5 mil milhões de euros, para sustentar o falido banco do Grupo Espírito Santo, verba que, como tem sido habitual até agora, sairá exclusivamente dos bolsos dos trabalhadores e reformados portugueses…


2. Pois é! Tal como íamos dizendo, o Banco Espírito Santo lá faliu… Não sei se os meus estimados leitores estarão ainda lembrados, mas em 15 de Abril passado – já lá vão quase quatro meses – publiquei aqui um artigo, intitulado Banco de Portugal e BES: Quem Supervisiona o Supervisor?, artigo que ainda está on-line e que talvez mereça uma última mirada dos vossos olhos. Examinando aí o relatório e contas do Banco Espírito Santo (BES) relativo ao exercício de 2012, chegava eu então à conclusão de que o BES estava falido, e, perdoar-se-me-á a imodéstia, fui a primeira pessoa em Portugal a afirmá-lo publicamente, por escrito e com muita antecedência.

Não deixei de aí aproveitar a oportunidade para exautorar vivamente a incompetência, a irresponsabilidade – senão mesmo a corrupção! – do supervisor Carlos Costa, governador do BdP, e ataquei desassombradamente os deputados e partidos da esquerda parlamentar, por não terem ousado convocar a comissão da Assembleia da República encarregada do controlo do supervisor, tarefa esta que só cumpriram (e muito mal) hoje, dia 7 de Agosto. E terminava o meu escrito, de uma maneira quase profética:

A Assembleia da República, e sobretudo os grupos parlamentares do PS, BE e PCP, não podem enjeitar responsabilidades se, dentro de algum tempo, vier a acontecer alguma coisa de muito sério e de muito grave à banca portuguesa, sobretudo quando, como é o caso do BES, temos estado à espera de garantias de Angola para reduzir o risco dos activos subscritos, com conhecimento ou sem conhecimento de causa, pelos clientes do retalho”.

O Banco Espírito Santo faliu. E faliu porque, sendo um banco comercial de retalho, utilizou, contra lei expressa, os depósitos dos seus clientes para financiar, frequentemente sem conhecimento deles próprios, o endividamento das empresas do Grupo Espírito Santo, ao juro baixíssimo a que remuneravam os depósitos dos seus depositantes. No fundo, a quadrilha da família Espírito Santo transformou, assim, um banco comercial num banco de investimento nas dívidas das empresas do Grupo Espírito Santo.

Muitas vezes, sem o saberem, os depositantes do BES foram os financiadores da quadrilha do GES e das suas empresas endividadas e falidas.

Quando implodiu, em 30 de Julho de 2014, os depósitos do BES totalizavam, em números redondos, 37 mil milhões de euros, dinheiro que desapareceu no crash do BES em bolsa, nas empresas falidas do Grupo e nos bolsos da quadrilha de bandidos da família Espírito Santo.

O BES apropriara-se criminosamente do dinheiro dos depositantes e estes ficaram a ver navios.

Por outro lado, o capital do BES estava representado por 5.624.961.683 acções, 10% das quais (551.246.245) detidos em muitos pequenos lotes por empresas e particulares não identificados, muitos deles certamente pequenos accionistas que, com o crash do banco em bolsa, no fim de Julho, ficaram sem as suas poupanças. Situação que se agravou com a total incompetência do regulador Carlos Tavares, da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, que autorizou uma emissão de 1,4 mil milhões de euros em novas acções do moribundo BES, cujo valor social se volatilizou em dois dias, acabando a dez cêntimos cada acção, quando aquele supervisor, com as calças na mão e em pânico, suspendeu a negociação das acções…

Enquanto o BES estrebuchava, teve de transferir três mil milhões de euros para o BES Angola (BESA), também em iminência de falência, verba colossal que foi para ali transferida por Salgado, na esperança de sacar a José Eduardo dos Santos, presidente de Angola, o prometido mas nunca concretizado empréstimo de 5,9 mil milhões de euros, verba que, após a falência do BES de Lisboa, serviu para Dos Santos comprar o BESA, por apenas 2,9 mil milhões de euros, pois o quadrilheiro Salgado já havia enviado para Luanda a quantia de três mil milhões de euros (5,9 mm – 3 mm = 2,9 mm). A família de José Eduardo dos Santos é agora maioritária no capital do BES Angola.

No negócio entre ladrões, o mais esperto é o que a final leva a melhor: e aqui, no caso do BES Angola, o ladrão mais esperto foi o angolano, que comprou, por 2,9 mil milhões de euros, um banco que tinha acabado de ver reforçado o seu capital com mais três mil milhões…

No estertor do BES de Lisboa, faliu o BES da Suíça – ESPB (Espírito Santo, Banque Privée) – e faliram o BES de Miami, com intervenção do regulador norte-americano, e o BES da Líbia.
Mesmo assim, Ricardo Salgado ainda teve também tempo de transferir para a sua conta pessoal num banco de Singapura a módica quantia de 30 milhões de euros, segundo informação da imprensa portuguesa de hoje (07/08/2014)!...

Pequenos e médios accionistas e depositantes viram-se assim confiscados das suas poupanças pela incompetência - ou será mais do que isso? – dos dois supervisores e pela ganância de uma quadrilha de bandidos.

E repare o leitor que a falência do banco da família Espírito Santo é tirada a papel químico da falência do BPN, este da família política cavaquista, no caso dirigida por Oliveira e Costa e pelo foragido Dias Loureiro, e da falência do BPP, da quadrilha de João Rendeiro. Como é possível que o mesmo governo e os dois supervisores permitam que estas acções de ladroagem se repitam, com total impunidade para as famílias quadrilheiras?

Quando se fala em valores realmente envolvidos nesta falência do Banco e do Grupo Espírito Santo, o governo de traição nacional Coelho/Portas e o supervisor oriundo do Banco de Portugal assobiam ao cochicho, ou guardam de Conrado o prudente silêncio. Mas é preciso ter a coragem de dizer ao País, alto e bom som, que 20 mil milhões de euros não chegarão para pagar o resgate da falência do Banco Espírito Santo, excepto se o resgate assumir, como deve efectivamente assumir, a forma de nacionalização sem indemnização de todos os activos do GES existentes em Portugal, assunto de que adiante falaremos.


3. Para que servem os reguladores e supervisores dos mercados financeiros, bancários e de valores mobiliários? Se acreditáramos na propaganda dos primeiros-ministros, dos ministros das finanças e dos próprios reguladores e supervisores, diríamos que servem para evitar as crises nesses mercados e introduzir regras de ética no seu funcionamento.

Nada mais falso, porém! Reguladores e supervisores intervêm depois das crises eclodirem, procurando que os mercados voltem a funcionar com a regularidade que convém aos negócios e negociatas dos capitalistas. E, quanto à ética, tudo se resume a uma norma: mentir, mentir com todos os dentes que têm na boca, contando que consigam conferir alguma credibilidade aos sistemas.

A origem geral da crise nos sistemas financeiros do capitalismo está, como sabem todos os marxistas, nos níveis da transferência das mais valias, geradas no sector da produção capitalista, para o sector bancário e financeiro do modo da produção do capital. Sempre que essas transferências são desproporcionadas para a economia em causa, o nervosismo das bolsas, a falência dos bancos e o colapso do sistema financeiro aparecem, e propõem-se, no meio de todo o seu irracionalismo aparente, conter e solucionar a crise por meio do único processo que o capitalismo conhece para tal efeito: a destruição mais ou menos maciça das forças produtivas e dos meios e instrumentos de produção, que acaba por se traduzir nos conhecidos fenómenos económico-sociais da austeridade, do desemprego, do roubo do trabalho e dos salários, da fome, da doença e da miséria.

Os reguladores não anteviram nem regularam nada a tempo. Fingem apenas que podem introduzir uma certa ordem na crise, mas só depois dela eclodir, à custa dos dinheiros do erário público.

Ora, os dois supervisores em causa no processo de controlo do Banco Espírito Santo - Carlos Costa, governador do Banco de Portugal (BdP), e Carlos Tavares, presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) – se todavia tivessem vergonha na cara, já deviam ter apresentado há muito a demissão dos seus cargos. Como vergonha é porém coisa que manifestamente não têm, então já deviam ter sido demitidos pelo governo. Mas vergonha é coisa que também não tem o governo de traição nacional Coelho/Portas, pois, se a tivesse, seria o próprio governo que há muito se haveria ele mesmo de ter demitido.

Os dois supervisores – Costa e Tavares – são, em primeiro lugar, totalmente incompetentes, em segundo lugar, têm uma compreensão totalmente errónea da natureza dos objectivos dos cargos que ocupam, e, em terceiro lugar, pela maneira como estão agarrados aos tachos, suscitam a arreigada presunção de que são pessoas corruptas.

Os supervisores nem por isso devem deixar de ser pessoas sérias, honestas e verdadeiras, de modo a granjear a absoluta confiança dos agentes económicos e financeiros para os quais actuam, em vez de dolosamente os ludibriarem, numa verdadeira caçada aos dinheiros dos desprevenidos.

O governador do Banco de Portugal, a quem ainda por cima cabe a suprema tarefa de orientar toda a actividade bancária nacional, não deve poder mentir, como sucedeu com Costa, que passou o mês de Junho e de Julho a tecer encómios à solidez económica e financeira de um Banco – o BES – que ele, a menos que queira reivindicar para si as qualidades de ignorante e de estúpido, elas também incompatíveis com o exercício da tarefa da supervisão, não podia deixar de saber que estava irremediavelmente falido e que, na actividade do banco, sob a direcção de Ricardo Salgado, se haviam cometido actos criminosos e imperdoáveis. E o presidente da CMVM não podia dar-se ao luxo de autorizar uma emissão de acções em bolsa, que fez pura e simplesmente desaparecer a quantia de 1,4 mil milhões de euros das algibeiras de pessoas que confiaram nas palavras e nos actos do presidente da CMVM. Porque alguém está sempre no direito de perguntar-se: Está bem!; mas quanto é que arrecadou o Tavares com uma operação bolsista tão tresloucada como aquela?!...

Os agentes económicos lesados pelas mentiras e incompetências de Carlos Costa e de Carlos Tavares deviam demandar civil e criminalmente os supervisores, exigindo, a eles e ao Estado, a condenação e o pagamento das indemnizações devidas. Porque a verdade é que a incompetência de um e de outro dos supervisores continua agora e ainda, com o mirabolante processo por eles gizado para resgate do banco falido.

O próprio Ministério Público já deveria ter submetido à mais apertada investigação e vigilância a conduta dos dois supervisores, pois não se compreende, a não ser por corrupção, que tenham estado até ao último momento ao lado da quadrilha Espírito Santo, ajudando-a com toda a espécie de mentiras e de golpes.

Diga-se, aliás de passagem, que também não se compreende por que é que o Ministério Público nunca submeteu as actividades mais que duvidosas da família e do grupo Espírito Santo à devida e necessária investigação criminal. É que, no mínimo, o Ministério Público e a Procuradora-Geral da República devem uma explicação ao País: será que, até agora, nunca repararam nas similitudes de actuação das três famílias de banqueiros: a família Espírito Santo, a família João Rendeiro e a família política cavaquista, esta encabeçada por Oliveira e Costa e Dias Loureiro? Nunca repararam que essas famílias enriqueciam, na exacta medida e ao mesmo ritmo em que os seus bancos faliam?

De que é que o Ministério Público então está à espera para levar ao juiz de instrução e deter a família Espírito Santo e os seus capangas? Está à espera de que fujam? Ou que façam desaparecer o dinheiro com que se têm impunemente locupletado?


4. Que solução para os problemas da falência do Grupo Espírito Santo e do Banco Espírito Santo?

O primeiro erro, grosseiro e grave, cometido simultaneamente pelo governo e pelos dois reguladores, foi o que consistiu em tentar separar, contra toda a lógica e até contra a sua própria natureza económica, o Grupo Espírito Santo e o Banco Espírito Santo, o GES e o BES. Isto mostra que, para aquelas três entidades, e à primeira vista, a questão devia ser tratada como o fora o problema da falência do BPN em relação à Sociedade Lusa de Negócios (SLN). É certo que, em ambos os casos, tanto a Sociedade Lusa de Negócios, como o Grupo Espírito Santo eram donos de um banco: a SLN, do BPN, e o GES do BES. Havia, porém, uma diferença radical: o BPN estava falido, mas a SLN, sua proprietária, não; e o BES estava falido, mas o GES também.

Assim, enquanto era teórica e financeiramente possível, separar o BPN da SLN, não era possível separar o BES do GES. Ora, o tempo que o governo e os reguladores perderam com esta falácia - separar o BES falido do também falido GES – foi o tempo que levou à implosão desses dois grupos de empresas ao desaparecimento do dinheiro do BES nas algibeiras da quadrilha de bandidos da família Espírito Santo.

Esta ficção obtusa, de que seria financeiramente sólido e economicamente apetecível um banco (o BES) que não passava de um simples activo falido de uma sociedade totalmente falida (o GES), levou à tragédia em que, desde o último domingo, está mergulhado todo o sistema financeiro e bancário português.

Sim, porque as coisas ainda mal começaram, e um futuro muito negro espera por Portugal…

O segundo erro, grosseiro e grave, do governo e dos dois reguladores foi o da monomania de insistir na solidez financeira do BES e na apetência da sua aquisição pelo capital privado. Esta estulta e estúpida mentira desabou como uma avalancha, quando o BES pretendeu reforçar o seu capital com a emissão em bolsa de 1,4 mil milhões de euros em novas acções. Em dois dias, as acções estavam à venda por 10 cêntimos cada uma, com uma desvalorização relâmpago de 90% em menos de 24 horas, que ia levando à falência bolsista não apenas todos os bancos portugueses, como a maior parte das sociedades do nosso PSI20.

Foi então que toda a gente viu, claramente visto, aquilo que tenho vindo a denunciar há muitos anos: que não temos em Portugal um único economista político que preste.

Em pânico e aterrorizados, o primeiro-ministro, a ministra das finanças, o governo, o presidente da República e respectivos conselheiros, depois de consultada a tróica e todos abraçados ao regulador Costa, desencadearam, entre quinta-feira e domingo, de 31 de Julho para 3 de Agosto, um golpe-de-estado legislativo contra a Constituição, contra a Assembleia da República e contra o povo português, aprovando, promulgando e referendando um pacote de diplomas legais, para que não tinham as respectivas competências, publicando alguns deles pela calada da noite e até nunca publicando alguns outros, mediante o qual pacote legislativo, que nenhum representante do povo português pôde estudar, conhecer ou autorizar, destruíram um banco que todos haviam jurado, até à véspera do golpe, como financeiramente sólido e economicamente apetitoso, dividiram o banco em dois bancos, sem consultar um único accionista e ainda menos os respectivos conselho de administração ou assembleia geral, baptizaram um dos bancos de Novo Banco – no que revelaram uma imaginação filológica prodigiosa, pois de certo não haverá nada de mais novo do que aquilo que acaba de nascer!... – chamaram ao outro banco de velho e de BES, - aqui na realidade se comprova que esgotaram toda a imaginação na designação do primeiro banco -, e entregaram ao Novo Banco tudo o que era velho mas que cheirava poder dar dinheiro (activos, depósitos, propriedades, sede, delegações, trabalhadores e administração do Bento careca), e ao velho banco – o BES – tudo o que suspeitavam não valer nada, como as acções, os accionistas, e todos os produtos financeiros designados de tóxicos.

A canalha que levou a cabo este golpe-de-estado nem imagina sequer na alhada em que se meteu e meteu o país, mas a realidade é que pode vir a pôr em causa e imediatamente todo o sistema financeiro e bancário português e pode arrastar Portugal para uma demanda litigiosa internacional, sem fim à vista e de despesas absolutamente incalculáveis.

Note-se que o BES, muito embora falido, não passa de um simples activo de uma holding luxemburguesa que pediu protecção contra os credores no tribunal de comércio do Grão-Ducado, e está em vias de ser declarada insolvente. Claro está que, ao esvaziar o BES de recursos, os credores da sociedade luxemburguesa, Espírito Santo Financial Group (ESFG) não vão aceitar o actual BES, nascido do golpe-de-estado legislativo, esvaziado da parte valiosa que foi unilateralmente conferida ao Novo Banco. Nem os accionistas, que são donos de um banco que, muito embora falido, tem todavia um activo e um passivo, irão aceitar ficar com um banco que lhes confiscou o activo, deixando-lhes apenas o passivo para pagarem.

Os autores do golpe-de-estado de 31.07 a 03.08 de 2014, ou não tiveram presente no espírito ou não quiseram extrair todas as conclusões da composição accionista do BES na ocasião do golpe, estrutura accionista essa que aqui se deixa projectada, para melhor compreensão do assunto:

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Ora, os accionistas estrangeiros conhecidos são os seguintes: Espírito Santo Financial Group, (20,1%), Crédit Agricole (14,6%), Bradesco (3,9%), Capital Research (4,2%), BlackRock (4,7%), Baros (2,01%) e Silchester (4,7%), os quais, tudo somado, são donos de 54,62% do capital do BES.

Como é que o supervisor Carlos Costa tenciona, sem ter de afrontar uma litigância processual que afundará ainda mais o défice das nossas finanças públicas, confiscar aquele parte maioritária e estrangeira do capital do BES?

Para resolver o problema da insolvência do BES, mas não da falência do GES, existia já no ordenamento jurídico português um diploma – a Lei nº1/2014, de 16 de Janeiro- -designado por lei de recapitalização bancária, que permitia ao Estado português recapitalizar com dinheiros públicos os bancos em vias de insolvência, assumindo o Estado o lugar e o papel de accionista, na proporção do capital público injectado. Com ligeiras diferenças em cada um dos casos concretos, foi esse o esquema utilizado na recapitalização do BCP, do BPI, do Banif e da CGD, a qual aqui se cita sem olvidar que já é um banco público. Os dinheiros públicos utilizados nesses casos provieram, como se sabe, de um fundo de 12 mil milhões de euros, disponibilizados pela tróica.

Recorde-se que o BPI, para se ver livre do Estado no controlo da administração do banco e para poupar no pagamento de juros, acaba de pagar, com grande antecedência, o capital público que havia recebido, e que o BES, claramente para evitar o controlo directo da administração do banco pelo indesejado sócio Estado, recusou a oportunidade de recapitalizar-se em 2012, agora sabe-se que para ocultar ao Estado os esquemas de financiamento fraudulento das empresas do Grupo Espírito Santo pelo seu banco de retalho.

Parece que foi Draghi e o Banco Central Europeu, a partir de Franqueforte (como se ouve dizer nos relatos de futebol...), que impuseram ao governo de traição nacional Coelho/Portas, ao paspalho do presidente da República e ao pau-mandado do supervisor Carlos Costa do BdP, o golpe-de-estado legislativo que substituíu, contra a Constituição, contra a Assembleia da República e contra o povo português, a Lei nº1/2014, de 16 de Janeiro, por um calhamaço de mais de duzentos artigos, intitulado Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado na longa noite das facas longas, que decorreu clandestinamente, entre Belém e São Bento, de 31 de Julho a 3 de Agosto.

Assim, em vez da recapitalização bancária em que o Estado recapitalizante assumia a qualidade accionista e de administrador do banco recapitalizado, o Banco de Portugal impôs clandestinamente um novo sistema, aplicado à experiência e pela primeira vez em Portugal, chamado de Resolução Bancária.

A resolução bancária é o sistema com que, mediante capitais públicos e à custa do contribuinte, se reprivatiza um banco privado falido!...

Sucede que, também em 15 de Abril passado – nesse mesmo dia em que aqui publiquei aquela notícia da falência do BES com quase quatro meses de antecedência sobre o seu estouro definitivo – trouxe aos meus leitores um outro escrito, desta feita intitulado Como Votam os Traidores em Bruxelas e Estrasburgo?, no qual dava conta da actividade frenética da eurodeputada do PS Elisa Ferreira, para fazer aprovar, na noite (Ah!, porque será que os traidores fazem tudo na clandestinidade e de noite?!) de 14 de Abril, última sessão do Parlamente Europeu, antes de encerrar para férias e para o novo acto eleitoral, um diploma sobre a União Bancária na Europa, designado de Mecanismo Único de Resolução dos Bancos e Instrumento de Resgate Interno, pelos quais mecanismo e instrumento o Banco Central Europeu e o imperialismo bosche passariam a controlar todo o sistema bancário e todos os bancos da União Europeia.

Ora, foram precisamente esses mecanismo e instrumento únicos de restauração dos bancos em toda a Europa – que, apesar de aprovados no Parlamento Europeu, ainda não entraram em vigor na União, desde logo porque não foram ainda aprovados nos parlamentos nacionais e porque não se acham ainda constituídos os fundos europeus de resolução bancária e de garantia de depósitos - foram precisamente esses mecanismo e instrumento que no golpe-de-estado nocturno de 31.07 a 03.08 de 2014, foram impostos ao povo português. Só que, em Portugal, não havia, até à data do golpe-de-estado e em boa verdade até hoje, nenhum fundo de resolução bancária, constituído por contribuições de bancos, e o fundo de garantia de depósitos, actualmente no montante de 1,49 mil milhões de euros, não assegura o resgate, no valor de 100.0000 euros, por cada depositante do BES (que tem 38 mil milhões de euros de depósitos, sem todavia ter revelado até hoje o número dos seus depositantes) quanto mais o resgate de todos os depositantes de todo o sistema bancário nacional (117,411 mil milhões de euros de depósitos) todos garantidos por aquele exiguíssimo e ridículo fundo de 1,49 mil milhões de euros.

E, por outro lado, como não havia nenhum fundo de resolução bancária constituído por participações dos bancos, o fundo, que devia ser totalmente privado e de âmbito europeu, vai ser unicamente constituído pelos 4,9 mil milhões de euros provenientes do erário público, verba que sobrou do fundo inicial da tróica para a recapitalização bancária, no montante de 12 mil milhões.

Pelo golpe-de-estado legislativo da noite das facas longas, Portugal foi obrigado a servir de cobaia do mecanismo de resolução bancária, que ainda não está em vigor no espaço da União Europeia. Os imperialistas europeus exultaram com este papel de cobaia a que sempre estão dispostos os traidores que nos governam. O Le Monde, actualmente engraxador dos sapatos de Monsieur Hollande, no editorial do director, saído em 6 de Agosto, sobre o título interessante e muito significativo A União Bancária Experimentada em Portugal, escreve esta prosa que nos deveria fazer morrer de ultraje e de vergonha:

É uma boa notícia para a zona euro. Após um mês de turbulências nos mercados e do temor de contágio ao resto da economia, o governo português decidiu-se, domingo dia 3 de Agosto, a ajudar o Banco Espírito Santo em dificuldades. O plano de salvação foi aplicado em 48 horas. Os accionistas e credores não prioritários vão ter que meter as mãos nos bolsos, enquanto que os depositantes e contribuintes são poupados. Para o obter, Lisboa seguiu escrupulosamente as regras que a zona euro tentará aplicar depois da crise. A união bancária logrou a primeira prova à escala natural, e devemo-nos todos felicitar pelo caminho percorrido desde 2010”.

A verdade é que Le Monde, para exorcizar terrores próprios, deita foguetes antes do tempo. Na realidade, não há nada que nos garanta que a cobaia portuguesa não irá sair completamente pelada desta experiência surrealista, para que foi empurrada a partir de Franqueforte.

Se não, vejamos! 

A quanto é que monta o fundo de resolução para resgatar o BES? O supervisor, sob a gestão do qual correrão todas as operações daqui para o futuro, fala em 4,9 mil milhões de euros, 4,5 mil milhões dos quais injectados pelo erário público. Para saber se o montante desse dinheiro será suficiente para resgatar o BES, terão de se conhecer dois parâmetros: qual é o défice actual do BES e em quanto tempo se propõe o regulador absorver esse défice.
Ora, sobre este dois parâmetros, o supervisor, que não parece abundar muito em inteligência, não disse uma palavra até hoje.

Nos termos do relatório e contas do BES apresentado já pela administração de Vítor Bento, o prejuízo do banco da família Espírito Santo no primeiro semestre de actividade deste ano subia a 3,577 mil milhões de euros. Sendo esta uma verba absolutamente incomensurável e nunca alcançada por nenhuma entidade bancária ou financeira portuguesa, nada garante que o prejuízo do BES não seja muitíssimo superior ao prejuízo agora admitido.

Suponhamos que, na linguagem do Barredo que caracteriza o supervisor Costa, o Novo Banco ficará com a parte boa do BES e o BES com a parte má de si mesmo. Consultemos então a conta do balanço consolidado do BES relativa ao primeiro semestre de 2014, última conta que existe publicada, e da autoria da administração do Vítor careca.

Passará para o Novo Banco o activo, assim constituído:

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Deste activo, quanto logrará o Novo Banco cobrar? Das aplicações financeiras e do crédito a clientes, no montante de 71 mil milhões de euros, em números redondos, o Novo Banco poderá não deitar a mão a um único cêntimo, atendendo às falências das empresas do GES, elas mesmas devedoras ao banco, e dos bancos do próprio BES, e à época de crise em que vivemos, com o crédito mal parado a atingir nos nossos bancos rácios da ordem dos 30%.

Se o Novo Banco alcançar um terço do seu crédito a clientes e das suas aplicações financeiras – e não há garantias de que o alcance – o activo acima descrito perderá a quantia de 48 mil milhões de euros, em números redondos. E nem nos preocuparemos com as outras rubricas do activo, porque o Novo Banco, quanto à maior parte delas, não arranjará maneira de as cobrar.

O activo ficará assim reduzido a 34 mil milhões de euros, se não a menos ainda.

No balanço consolidado apresentado pela administração de Vítor Bento, vêm descritas no passivo do BES as seguintes verbas:

novobancopassivo

Deste passivo, passará para o Novo Banco pelo menos os empréstimos contraídos junto do Banco Central Europeu (8 613 740), os recursos, isto é, os depósitos de clientes (36 685 238), as provisões (3 357 099), e os empréstimos seniores que não se conhece a quanto montarão no global de 24 354 500 euros. Admitindo que do passivo passará para ao Novo Banco o mínimo possível, e deixando de parte o montante desconhecido dos empréstimos sénior, tudo coisas que o nosso sábio supervisor descarta esclarecer, então haverão de passar, no mínimo, 47 mil milhões de euros, em números redondos.

Em síntese, até que Carlos Costa esclareça, como lhe cumpre, definitivamente o que passa e o que não passa do velho BES para o Novo Banco, nós podemos concluir, com absoluta segurança, que passará um activo no montante de 34 mil milhões de euros e um passivo de 48 mil milhões de euros, tudo números redondos.

O Novo Banco começa assim a viver com um prejuízo de 3,577 mil milhões de euros e um défice de 15 mil milhões de euros. Os 4,9 mil milhões de euros que atestam o chamado fundo português de resolução bancária não chegam, de maneira nenhuma, para recuperar o BES. É preciso pôr lá 20 mil milhões de euros!

Por mais que queira fazer-se passar por parvo, o supervisor Carlos Costa pode pedir a alguém, no Banco de Portugal, que lhe calcule com correcção, como aqui se faz, o montante que há-de constituir o fundo de resolução do BES. Ele próprio, supervisor, saberá – e não se vê por que é que o oculta – que precisa desses 20 mil milhões de euros para o efeito.

E onde é que os vai ele buscar? Irá buscá-los aos depósitos dos clientes, como o Banco Central Europeu já mandou fazer, há dois anos – a partir de Franqueforte!... -, no banco de Chipre. Ora, no BES – e no Novo Banco – os depósitos dos clientes montam, como já se viu, a 37 mil milhões de euros; por isso aqui fica, estimado leitor, o meu conselho veemente e urgente aos depositantes do BES, cujas contas irão agora transitar para o Novo Banco:

LEVANTEM IMEDIATAMENTE OS VOSSOS DEPÓSITOS NO NOVO BANCO, PORQUE, MAIS DIA MENOS DIA, VÃO FICAR SEM ELES, COMO JÁ SUCEDEU COM OS DEPÓSITOS NO BANCO DE CHIPRE!

E notem que, dada a exiguidade ridícula do Fundo de Garantia de Depósitos português (1,49 mil milhões de euros, como se deixou supra-referido), nem quanto à propalada garantia dos 100 mil euros por depósito se pode acreditar nela.

As medidas agora postas em prática, mediante um verdadeiro golpe-de-estado, pelo governo de traição nacional Coelho/Portas, pelo espantalho de Belém e pelo supervisor Carlos Costa, vão roubar os depositantes do BES, vão aumentar em 20 mil milhões de euros a nossa dívida pública e acarretarão mais austeridade, mais roubo no trabalho e no salário, mais corte nas pensões e nas reformas, mais emigração, mais fome, e mais miséria.


5. A resolução bancária não é pois solução para o BES. E não há, como se deixou já sublinhado, apenas um problema com o BES; há também um problema com o GES, problema de que nem o governo, nem os reguladores e – pasme-se! – nem a oposição parlamentar falam.

Muito embora sedeado, através das suas holdings principais, no Grão-Ducado do Luxemburgo, o falido Grupo Espírito Santo constitui um factor importante de desenvolvimento económico e financeiro do nosso país. O BES era o primeiro banco privado português na altura em que explodiu, controlando 20% da actividade bancária e financeira nacional. O Grupo Espírito Santo, por seu lado, era, pelo papel que desempenhava na economia portuguesa, uma estrutura chave da nossa produção económica.

Foi este gigante que caiu às mãos dos bandidos da família Espirito Santo.

Este Grupo, incluindo o banco e respectivas filiais, está insolvente e vai ser vendido ao desbarato, como já aconteceu com o negócio fraudulento do BPN, vendido por tuta e meia ao governo parasitário da família José Eduardo dos Santos.

Tudo o que existe em território português, ligado ao GES e aos seus bancos, deve ser imediatamente nacionalizado, sem pagamento de um único cêntimo (o que se justifica por estar o GES globalmente insolvente), e entregue ao controlo total dos cerca de 20 000 trabalhadores portugueses do Grupo. Nacionalizados devem sê-lo também as empresas e os activos estrangeiros que fizerem parte das carteiras das sociedades e empresas portuguesas do GES e do BES.

E, claro está, nacionalizados devem ser igualmente o BES e todas as agências e filiais existentes em Portugal e no estrangeiro, igualmente sem pagamento de qualquer indemnização, excepto se estiverem em causa activos de empresas estrangeiras não insolventes, onde os activos do Grupo poderão e deverão ser negociados.

A crise por que passa o GES e o BES são a crise do capitalismo português no âmbito da crise financeira mundial do imperialismo. Em Portugal, as reprivatizações frenéticas dos governos do PS e do PSD serviram apenas para demonstrar a falência total do capitalismo e dos capitalistas portugueses, e da sua impossibilidade histórica de desenvolver a nossa economia e as nossas finanças. A corrupção, a banditagem, a ladroagem e a exploração desenfreada é o que tem caracterizado, sobretudo nos últimos trinta anos, o capitalismo português e o capitalismo em Portugal.

O nosso país deve voltar ao controlo das suas forças produtivas e dos seus meios e instrumentos de produção, para, com total independência e autonomia, libertar a pátria e encorajar o nosso povo a construir o seu futuro.

Nacionalizemos, pois, sem temor o Grupo Espírito Santo e o Banco Espírito Santo, sem pagamento de qualquer indemnização, pois as suas estruturas estão falidas, estão insolventes e, se não forem imediatamente nacionalizadas, serão vendidas ao desbarato ao capitalismo espanhol, angolano, brasileiro e chinês, que já salivam de apetite à vista das nossas desgraças.

E agora que apelamos à nacionalização do GES e do BES, cabe frontalmente perguntar: afinal, qual é, com exactidão, a posição de cada um dos partidos da chamada esquerda parlamentar nesta matéria? Estão ou não em desacordo com a política reaccionária de resolução bancária? Como pensam resolver o problema dos 20 000 trabalhadores do GES e do BES, ameaçados de desemprego com a implosão do Grupo? Deixem-se lá - PCP, BE e PS (seja do lado do Costa, seja do lado do Seguro) - de meias tintas! Será que essa canalha, pretensamente de esquerda, tem dúvidas sobre quem irá pagar mais esta crise, se não se proceder à nacionalização imediata de todo o Grupo Espírito Santo?

E digam, de uma vez por todas, se estão a favor ou contra a nacionalização. É que faz vomitar as tripas aos portugueses o oportunismo com que vós - PC, BE e PS - mastigam e ruminam um assunto de tamanha importância.


6. Sucede todavia que o caudilho da quadrilha de bandidos da família Espírito Santo foi, até domingo passado, o banqueiro do regime em Portugal!... 

Com efeito, desde que a Banca foi totalmente reprivatizada, com excepção da Caixa Geral de Depósitos, pelos sucessivos e reaccionários governos do PS e do PSD, destruindo as nacionalizações conquistadas pela revolução de Abril, Ricardo Salgado, em vez de denunciado como um bandido que sempre foi e era, foi levado ao colo pelos órgãos da comunicação social capitalista e por jornalistas corruptos, que ainda hoje se passeiam nas nossas ruas e em todos os jornais e televisões, comprados pela família Espirito Santo, para louvaminharem todos os dias o banqueiro do regime.

Na verdade, o banqueiro do regime sucedeu até à banqueira do povo, mas foi preciso chegarmos aos dias de hoje, dias de falência do Grupo e do Banco Espirito Santo, para que toda a gente se tenha apercebido de que os métodos, os processos, as burlas e as ladroagens dos dois banqueiros – a do povo e o do regime – eram em todos semelhantes, salvo a diferença de que a quadrilha de Ricardo Salgado era constituída por profissionais da banditagem, enquanto que o grupinho da velha D. Branca era uma coisa de amadores.

Certo é que, a partir de determinada altura, todos os grandes negócios do Estado passavam inevitavelmente pelo Grupo, pelo Banco, e pela família Espirito Santo, e sempre por Ricardo Salgado. As fragatas, os submarinos e os helicópteros da marinha de guerra, os carros de combate, os sistemas de armas e os fornecimentos para o exército, as pontes rodoviárias, o comboio na Ponte, o Alfa e o Pendular, as scuts (auto-estradas, ditas sem custo para os utilizadores), os hospitais e as parcerias público-privadas, os leoninos contratos swaps, tudo o que cheirasse a dinheiro – a bom dinheiro! – e a superendividamento do Estado passava, sem apelo nem agravo, pelo Grupo, pelo Banco, pela família Espirito Santo e pelo banqueiro do regime Ricardo Salgado.

Aliado de Guterres e íntimo de Sócrates nos seus dois governos, foi o banqueiro do regime quem apoiou o último daqueles dois primeiros-ministros no ataque à TVI e à tentativa de açambarcamento do banco de Jardim Gonçalves. Foi Salgado quem forçou Sócrates a assinar o memorando de entendimento e a aconselhá-lo a intervenção da tróica em Portugal.

Foi o banqueiro do regime quem cunhou a expressão, e com ela insultou o nosso povo, de que os portugueses viviam acima das suas possibilidades. Abandonando depois Sócrates, a quem praticamente forçou à demissão, Salgado passou todo o seu apoio ao governo de traição nacional Coelho/Portas, como aliás já antes havia apoiado Barroso e Santana Lopes.

Desde meados dos anos 90, bem se pode dizer que nunca houve um governo em Portugal, fosse qual fosse o partido maioritário, que não tivesse ministros ou secretários de estado do Grupo Espírito Santo e do Banco Espírito Santo. Todos os governos foram governos do Grupo Espírito Santo e o actual governo de traição nacional Coelho/Portas é ainda um governo da quadrilha de gatunos Espírito Santo.

É precisamente por tudo isso que agora se vê Sócrates a verberar a detenção do banqueiro do regime pelo Ministério Público, assim como se vêm Passos Coelho e Portas a esportular 4,5 mil milhões de euros, roubados ao povo português através de um golpe-de-mão nocturno sobre as instituições, para manter em funcionamento a quadrilha de bandidos de Ricardo Salgado e da família.

Aquilo que, nas últimas três décadas, corre sob o nome de democracia portuguesa, é, no fundo, o regime do banqueiro do regime.

Estejam, pois, preparados porque, com excepção dos comunistas do PCTP/MRPP, ninguém sairá à praça nem puxará do cajado para desengonçar o patife que andou todo este tempo a roubar o povo português.

E sabem uma coisa, caros leitores?: o banqueiro do regime dividiu, na proporção que só ele conhece, o produto do roubo com todos os partidos do regime – eu disse todos os partidos do regime, todos os partidos parlamentares -, a todos eles pagou e a todos eles teve acorrentados pelo cabresto aos seus interesses de ignóbil capitalista.

Por isso ninguém verá, nem Soares nem Cavaco, nem Passos Coelho nem Portas, nem Cravinho nem Santana Lopes, nem Costa, nem Louçã nem nenhum dos economistas e financeiros portugueses com assento fixo nas pantalhas das televisões, dirigir uma única critica ao banqueiro do regime, porque todos eles já comeram e ainda muitos estão a comer agora na mão do dito cujo Salgado.

O escândalo nacional não reside apenas na explosão do GES e do BES; reside também no desmascaramento que traz dos partidos, dos dirigentes e da vida política que rodeia o poder em Portugal.

Nunca haveria um banqueiro do regime se o regime não fosse dos banqueiros.

Quem quer que o banqueiro tenha comprado, há uma coisa que ele nunca comprará: a voz da classe operária e do povo português, que, neste momento, exige à Procuradora-Geral da República e ao Ministério Público que cumpram o seu dever e prendam a quadrilha de gatunos que enriqueceu à custa dos trabalhadores, neste período tão difícil da vida portuguesa. E ponham a nu o nome dos políticos e partidos que receberam dinheiros do Grupo Espírito Santo e de Ricardo Salgado.

E façam-no depressa, porque nas ruas já se ouve toda a gente comentar: mas não há Ministério Público nem há Procuradora-Geral da República neste país? Os gatunos vão poder andar por aí à solta e impunemente?

Eu entendo que não!



Espártaco

Texto revisto e republicado em 11.08.2014