Artigos
O “consenso social” em torno do Acórdão do Tribunal Constitucional!
- Publicado em 06.07.2012
- Escrito por Luis Júdice
- Visitas: 8496
Foi com um profundo e sentido “lamentamos que as decisões do Tribunal Constitucional não sejam aplicadas de imediato” que toda a “esquerda parlamentar” e respectivos apêndices – CGTP e UGT –, mas mesmo assim considerando tratar-se de uma “excelente vitória para os trabalhadores portugueses”, reagiram ao Acórdão nº 353/12 produzido pelo Tribunal Constitucional, na sua sessão plenária de 5 de Julho do corrente, que julgou o pedido de declaração de inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 21º e 25º da Lei nº 64-B/2011, de 30 de Dezembro de 2011, a famigerada Lei do Orçamento de Estado para 2012, procedente.
Mas, aparte o que estes basbaques oportunistas – com quem todos aqueles que se afirmam contra o sectarismo querem que nos unamos – deduzam e, pior do que isso, querem que o povo e os trabalhadores deduzam como eles, analisemos de forma mais sistemática e criteriosa as motivações e o conteúdo do referido Acórdão.
Quanto às motivações, considera o TC que o confisco dos subsídios de férias e de natal aos trabalhadores da função pública e aos pensionistas se traduz “numa imposição de um sacrifício adicional que não tinha equivalente para a generalidade dos outros rendimentos provenientes de outras fontes”, concluindo que “a diferença de tratamento era de tal modo acentuada e significativa que as razões de eficácia na prossecução do objectivo de redução do deficit público que fundamentavam tal opção não tinham valor suficiente para o justificar”.
Não é, portanto, a ilegalidade e a inconstitucionalidade do confisco que o TC coloca em causa, como nos pretende fazer crer a “esquerda parlamentar” e seu apêndices da CGTP e UGT. É, tão só, o tão propalado princípio da “equidade” que se deseja ver implementado. O princípio de que “ou há moralidade ou comem todos”, que pretende escamotear que aquelas e outras medidas já em preparação pelo governo de traição de Passos/Portas, para além de anularem direitos adquiridos, pretendem que sejam os trabalhadores e o povo, e somente eles, a pagar uma dívida que não contraíram, nem foi contraída para seu benefício.
E, o “consenso social”, a grande plataforma de “união de todos os portugueses honrados”, que já se verifica no parlamento e na “concertação social”, revela-se agora, também, em torno do Acórdão do TC. Se PCP e BE se limitam a “lamentar” que o referido Acórdão não tenha aplicação e efeito imediatos, fazendo tábua rasa da conclusão a que o TC chegou, isto é, “que a dimensão da desigualdade de tratamento que resultava das normas sob fiscalização, ao revelar-se manifestamente desproporcionada perante as razões que a fundamentavam, se traduzia numa violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Constituição”, o que levou este tribunal a declarar “inconstitucionais as normas dos artigos 21º e 25º” da supracitada Lei do Orçamento de Estado para 2012, é porque, objectivamente, estão de acordo que não é o confisco que estava a ser efectuado que está em causa, mas “apenas” o facto de ele estar a ser aplicado “somente” aos trabalhadores da função pública e aos pensionistas.
Aproveitando as preciosas “dicas” do TC, e o embandeirar em arco da “vitória dos trabalhadores” propalada pela “esquerda parlamentar” e seus apêndices, Passos Coelho e o seu governo de traição, serventuário dos interesses da tróica germano-imperialista, já veio anunciar que está a “ponderar” sobre a decisão do TC! E o TC, a “esquerda parlamentar” e os espartilhos do movimento sindical – CGTP e UGT –, em uníssono consenso, estão a dar-lhe a folga de que tanto necessita para fazer face à mais do que certa reacção e luta que as intenções deste Acórdão e sua aplicação, quer em 2012, quer nos anos subsequentes, vão representar para os trabalhadores e para o povo, isto é, mais fome, mais miséria e mais desemprego.
Iludindo que a questão da inconstitucionalidade suscitada não redundou, como exigem os trabalhadores e o povo, na imediata revogação daquela medida terrorista e fascista, mas tão só na distribuição do “mal pelas aldeias”, o que PCP e BE estão a admitir é que estão de acordo em que – no todo ou em parte, com mais ou menos tempo para a pagar – sejam os trabalhadores por conta de outrem, afectos à função pública ou ao sector privado, a pagar uma dívida que, insistimos, não contraíram, nem foi contraída para seu benefício. Sim, porque ninguém esperará que quando esta gente fala de "equidade" esteja a pensar na nacionalização da banca e das empresas e sectores estratégicos relevantes para a economia, nas grandes fortunas e rendimentos, na ruptura unilateral de contratos que têm servido para encher os bolsos aos accionistas privados e esvaziar os cofres do estado. Do que eles estão a falar é do dinheiro a todos os trabalhadores confiscado através do aumento dos impostos directos e indirectos, da abrupta diminuição das prestações sociais e da dificultação e encarecimento do acesso à saúde, ao ensino e aos transportes.
Depois, o TC, ao afirmar que “atendendo a que a execução orçamental de 2012 já se encontra em curso avançado”, ao reconhecer “que as consequências desta declaração de inconstitucionalidade poderiam colocar em risco o cumprimento da meta do déficit público imposta nos memorandos que condicionam a concretização dos empréstimos faseados acordados com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional, pelo que restringiu os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, nos termos permitidos pelo artigo 282º, nº 4, da Constituição, não o aplicando à supressão do pagamento dos subsídios de férias e de Natal, ou quaisquer prestações correspondentes aos 13º e, ou, 14º meses, relativos ao ano de 2012”, o que está a indicar ao governo Passo/Portas é a saída “constitucional” para o confisco dos subsídios de férias e de natal, agora extensivo, em nome da “equidade”, a todos os trabalhadores, durante o ano de 2013 e subsequentes. O que está é a legitimar o princípio de que Portugal é, agora, uma sub-colónia ou protectorado do imperialismo germânico, não tendo autonomia, sequer, para estabelecer o programa orçamental que melhor se compagine com os interesses do povo e de quem trabalha.
Só os incautos se deixaram, pois, surpreender com o facto de o TC ter, tal "bela adormecida", apenas agora, quando já foram confiscados os subsídios de férias deste ano, e estão para ser confiscados os de natal aos trabalhadores da função pública e aos pensionistas, despertado para uma realidade há muito denunciada. A "dança" das nomeações para os 3 juízes que faltavam para completar o elenco deste tribunal, mais não correspondeu do que ao lento “marinar” das medidas que estavam a ser cozinhadas pelos partidos que têm assento neste órgão de soberania – PS, PSD e CDS – e com as quais estão todos, no essencial, de acordo, apesar de algumas "divergências" formais. Isto é, as medidas que a tróica germano-imperialista impôs que se aplicassem sobre o povo e quem trabalha para o obrigar a pagar uma dívida que não contraiu, nem foi contraida para seu benefício e que todos aqueles partidos assinaram de cruz. Aliás, a confirmar o que atrás fica dito, o Acórdão agora aprovado pelo TC reconhece que, afinal, o “modelo” de confisco antes aplicado pelo governo Sócrates, de má memória, é o que deverá ser implementado para o futuro. E ainda dizem que o Bloco Central, o “centralão”, não está a vigorar! Madalenas arrependidas que ainda acreditam no Pai Natal e na “violenta…mas construtiva” oposição do PS!
Paradigmática é a intervenção da CGTP, que numa primeira "reacção" à notícia não considera esta manobra da burguesia, através do seu TC, um autêntico golpe de estado constitucional e balbucia uma reacção "enérgica" da central sindical que dirige, se o resultado for o de estender a medida do confisco ilegal a todos os trabalhadores. Vindo de quem, à saída de duas grandiosas jornadas de luta – as Greves Gerais de 24 de Novembro de 2011 e de 22 de Março de 2012 – se limitou a propôr como bandeira de luta para operários e trabalhadores um aumento salarial de 35 €/mês, não poderemos esperar muito. O que o momento exige é que os trabalhadores e o povo imponham aos seus sindicatos e às Centrais Sindicais a que estão associados, a imediata convocação de todas as Greves Gerais Nacionais, a sério, que sejam necessárias para dar um combate sem tréguas aos efeitos da aplicação deste Acórdão do TC.
Independentemente do que os habituais politólogos, opinadores, especialistas e economistas venham a dizer nos próximos dias, aproveitando a profusa generosidade de tempo de antena que os “meios de comunicação social”, claramente afectos aos grandes grupos económicos e bancários que têm retirado desta crise e da dívida chorudos dividendos, lhes proporcionam, o que este Acórdão do Tribunal Constitucional deixa claro para os trabalhadores e para o povo é a necessidade de se unirem, se organizarem e mobilizarem para derrubar este governo e constituir um governo democrático patriótico que, em relação à dívida, diga, claramente, NÃO PAGAMOS!