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PAÍS

Soares e o Governo PSD/CDS

Talvez já ninguém se lembre, mas a atitude inicial de Soares para com Passos Coelho, quando este tomou de assalto a direcção do PSD, ganhou as eleições legislativas e formou governo com o CDS, foi uma atitude de franco entusiasmo e de apoio incondicional. Para Mário Soares, Passos Coelho era um homem inteligente, transparente, democrata e merecedor de um crédito de confiança dos portugueses.

Passado menos de um ano, Soares já tinha engolido todos os elogios que vomitara sobre Passos Coelho, cavando na maior parte dos socialistas a ideia terrífica de que o fundador do PS devia andar xexé.

De facto, nem ao Diabo lembraria prodigalizar louvores ao sujeito que tinha arriado Sócrates do poleiro e tomara conta do galinheiro governamental.

Soares só começou a criticar Coelho, quando o governo de traição nacional PSD/CDS apresentou a sua primeira proposta de orçamento, mas, mesmo assim, com observações suavíssimas, professorais e paternalistas.

Até que, há poucos dias, depois da ameaça da manipulação da Taxa Social Única, Soares perdeu completamente as estribeiras e pediu a demissão do governo, única pecularidade que o distinguiu das críticas da comadre Ferreira Leite.

Para quem, como nós, conhece bem Soares e as suas melodias, a exigência da demissão do governo era bem vinda, mas não se podia acreditar muito nela.

Bem vinda, porque, de algum modo, juntava-se à reivindicação revolucionária dos operários e sindicalistas de esquerda que, desde a greve geral nacional de 24 de Novembro de 2011, andavam a tentar impor à Intersindical e à UGT a adopção da linha geral do derrubamento do governo.

Mas, em todo o caso, ninguém de bom senso se poderia fiar em Soares, à uma, porque Soares chegara muito tarde à reivindicação do derrubamento do governo, e , à outra, porque a política do derrubamento do governo pressupõe a definição concomitante da natureza, carácter e conteúdo do governo que haverá de substituir o executivo derrubado.

Numa primeira aproximação ao problema, Soares nada disse sobre o novo governo, subsequente da demissão do governo Coelho /Portas.

A paralisia mental de Soares era compreensível, pois Seguro já tinha deixado claro – ou, melhor dito, já avisara – que não queria ser governo senão depois de eleições e que não havia razão para suscitar eleições legislativas a três anos do cumprimento de um mandato.

É então – e só então – que Soares acorda para a composição política do diferendo que manifestamente o estava a opor a Seguro: não é preciso haver eleições antecipadas, terá pensado; basta que o presidente da república envide esforços para promover a formação de um governo de salvação nacional, obviamente de iniciativa presidencial.

Antes da reunião do último Conselho de Estado, Seguro fez constar publicamente que não estava disponível para participar em nenhum governo de salvação nacional nem de iniciativa presidencial, deixando, pois, cair no vazio a sugestão de Soares, sugestão que evidentemente empurrava o PS para os braços do PSD, como Soares aliás já fizera com Mota Pinto na crise da dívida de 1983, quando impôs a formação do governo do chamado Bloco Central.

Vê-se, por conseguinte, que o objectivo de Soares, ao reclamar a demissão do governo Coelho/Portas na sequência da crise despoletada pela manipulação da TSU, era o de impor, com a ajuda do presidente da república, um novo bloco central, ideia que foi rejeitada por Seguro, mas que até agora não foi repelida nem pelo presidente da república nem por Passos Coelho.

No momento em que desferiu o mais violento ataque ao governo PSD/CDS, Soares chegou a propor, vejam lá, com a exigência da demissão do executivo Coelho/Portas, a constituição de um “governo democrático e patriótico”, tal como o PCTP/MRPP tem vindo a defender desde a primeira greve geral nacional de Novembro de 2011...

Mas, tirando esse episódio único na televisão logo a seguir à comunicação de Passos Coelho sobre a taxa social única, Soares nunca mais se reportou à necessidade - - essa sim, verdadeira necessidade – de um governo democrático e patriótico.

Até que anteontem, na página que regularmente assina no Diário de Notícias de Lisboa, Soares volta a abordar, sob uma pergunta curiosa (“Que Futuro para um Governo em tão Grande Descrédito?) a questão do executivo.

Claro que nesse escrito Soares esqueceu totalmente todas as críticas de esquerda que havia produzido nos últimos quinze dias e, sobretudo, esqueceu em absoluto aquele devaneio televisivo sobre a necessidade de um governo democrático e patriótico.

Na sua crónica jornalística, Soares ainda reconhece que “o governo está moribundo e ninguém o toma a sério: nem os empresários, nem os trabalhadores, nem gente do Povo, nem intelectuais, professores ou cientistas”.

Esta nova declaração soarista não só não é uma apreciação de esquerda como representa uma concepção extremamente perigosa, porque a verdade é que o governo Coelho/Portas, pese embora o seu descrédito generalizado – gatunos! gatunos!, gritou e grita o povo – ainda não foi derrubado e o que compete à classe operária e ao povo português é derrubar, aniquilar, por todos os meios ao seu alcance, esse governo de traição nacional.

Argumentar que o governo está moribundo e nada fazer para o liquidar é dar ao moribundo a possibilidade de continuar a trair o povo, a explorá-lo e a oprimi-lo.

Desde pelo menos Fernando Pessoa, todos os portugueses ficaram avisados que há efectivamente “cadáveres adiados que procriam”. E o cadáver adiado Coelho/Portas anda por aí a procriar à vontade um novo orçamento reaccionário, que é ainda mais fiscalmente terrorista portanto, do que o que fora anunciado pelo primeiro-ministro na sua passagem pela televisão a caminho da festa do S. Jorge.

Ora, a tarefa imediata do povo português é derrubar o actual governo e esmagá-lo, substituindo-o imediatamente por um governo democrático e patriótico – justamente as palavras que Soares pronunciou entre dentes naquela sua fugaz aparição televisiva – mas para que não haja dúvidas, um governo que rejeite o chamado memorando de entendimento, corra com a Tróica e repudie (ou, pelo menos, suspenda) o pagamento da dívida.

Como é evidente, não é nada disto que Soares augura. Depois daquele espirro por um governo democrático e patriótico, Soares, na sua crónica do Diário de Notícias, dá o dito por não dito e, como bom oportunista que é e sempre foi, vai perorando desta maneira:

“O governo está moribundo, ninguém o toma a sério (,...) Contudo, os impostos continuam a crescer, sempre a crescer. De momento, pensar em eleições é completamente inconveniente. Sou democrata e sei bem que não há democracia sem eleições. Mas há momentos em que eleições não se justificam (...)”.

Que fazer, então?

Soares, lembrando a conduta política do presidente da república italiana Giorgio Napolitano, acha que Cavaco Silva, sem novas eleições, deve demitir o governo e nomear outro governo por sua iniciativa, com o apoio no actual parlamento onde o PSD e o CDS detêm, como toda a gente sabe, uma maioria absoluta!...

Soares é um brincalhão...É óbvio que todo o governo de iniciativa presidencial, com apoio no actual parlamento, só pode ser um governo PSD/CDS ou um governo de bloco central PSD/PS. E, qualquer que seja o governo de iniciativa presidencial, será sempre um governo de traição nacional, pois será sempre um governo às ordens da Tróica, que aceita de joelhos o chamado memorando de entendimento, põe-se de cócoras a pagar a dívida e voltará com impostos, com impostos sempre a crescer, com desemprego sempre a crescer, com recessão sempre a crescer e com dívida sempre a crescer.

Tal é o futuro que Soares nos augura e nos propõe!

Como se disse já, a proposta de Soares para um governo da iniciativa de Cavaco chama a terreiro, com total despropósito, o exemplo italiano, mas isso só mostra que Soares não percebe patavina do que se passou – e se passa – em Itália. Em Itália, Giorgio Napolitano pôde avançar com um governo de iniciativa presidencial – o governo de Mário Monti – porque e quando Berlusconi foi forçado a demitir-se em consequência da ruptura da coligação, por via do abandono da aliança pela Liga do Norte, deixando Berlusconi em minoria no parlamento.

Só nessas especiais circunstâncias é que o presidente italiano pôde avançar com um governo da sua iniciativa, sem que este corresse o risco de ser chumbado no parlamento.

Em Portugal não se passa nada disso, sendo certo que a situação mais parecida seria a que resultasse do acto pelo qual o CDS porventura abandonasse a coligação com o PSD.

Em todo o caso, não vale a pena ter ilusões, pois, em Itália, o governo do tecnocrata Mário Monti concitou imediatamente o ódio geral do povo italiano, que tem respondido com lutas duríssimas, com manifestações populares e com greves operárias à política de austeridade, de sempre mais impostos, sempre mais desemprego, sempre mais recessão e sempre mais dívida...

Como se vê, no PS, nem Seguro nem Soares têm para propor-nos uma política que suscite o apoio do povo português. E não vale a pena perguntar aos dilectos leitores porque é que Soares não quer eleições, pois toda a gente já sabe a resposta: não apenas o PSD e o CDS, mas também o PS de Seguro, serão totalmente esmagados no próximo acto eleitoral legislativo, venha ele amanhã ou venha só no ano de 2015.


Lobo de Matos


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